FÁTIMA MENDONÇA – Salão Caravela & URBANO – Biombos e Outras Janelas

Fátima Mendonça Urbano

20 Setembro | 20 Outubro, 2018

Obras

Press release

Dois Artistas da Galeria 111 na Galeria Fonseca Macedo
FÁTIMA MENDONÇA – Salão Caravela
URBANO – Biombos e Outras Janelas

A expor regularmente na Galeria 111 desde 2001, Fátima Mendonça tem mostrado obras que marcam o seu percurso artístico e onde encontramos o medo, a solidão, as mágoas, a violência e a fragilidade humanas, as fantasias da infância e o confronto com a realidade adulta.
A casa sempre foi o elemento primordial da pintura de Fátima Mendonça. Ao contrário do que está convencionado, em que dentro de casa tudo é calmo e fora dela todos os perigos espreitam, aqui a casa está longe de ser um lugar de refúgio tal como o interior humano. As séries que pintou têm nomes muito expressivos – A Casa dos Bolos, A Casa do Desarranjo, A Casa do Desassossego, Gosto muito da minha Casinha, Eu tenho medo: lá, lá, lá, lá, lá… ou Casa-Carrossel. Formas de bolos e animais magoados ou aprisionados em armadilhas são uma constante. O fogo está omnipresente, quer para cozer os bolos, quer como ameaça exterior. Quando aparece uma menina ela está nua, de braços abertos, indefesa e vulnerável, muitas vezes fugindo de um fogo ameaçador. Em vez do aconchego a menina, presente ou ausente, nunca esteve tão abandonada e desesperada.
A série Assim… assim… assim… para gostares mais de mim é o livro aberto da sedução. Nestes trabalhos enormes tudo é perturbação e excesso. Como uma aranha que faz a sua teia para apanhar a presa, a personagem feminina tece as armadilhas para atrair o seu amado, com bolos a indicar o caminho para ele não se perder ou com uma sala forrada a bolo-mármore. Mas o exercício amoroso é perturbado pelo lado mais violento da paixão. A personagem feminina desafia o homem numa luta de morte. Corpos despedaçados e muitas próteses revelam a agressão e os ardis desse desafio.
A sua pintura é um exorcismo permanente para superar o medo.
A série Autorretratos é uma sequência de narrativas de violência e agressão física, manifestando-se por naturezas mortas bordadas na pele, arranhões feitos com habilidade e massa de bolo que se cola à pele e não sai. A violência psicológica é terrível “coze as tuas vergonhas, as tuas apoquentações, a tua cabeça, os teus medos”. Apesar das rezas e das penitências para esconjurar o medo, a menina tranquiliza-se a si mesmo “descansa, sossega, confia, aqui não há dor” e vai mais longe, querendo fugir e voar para escapar da prisão onde tudo é ameaçador. Num dos quadros lê-se “o que é que a Fátima tem, tem tudo e muitos medos como ninguém”.
Na série A Cura – Operação ao Cérebro tenta acabar com o seu enorme sofrimento sujeitando-se a uma operação delicada para eliminar a causa de tanta dor.
Na série Caravela Salão mais uma vez é abordado o tema do medo quer o dos antigos navegadores que enfrentaram mares desconhecidos e medos imaginários como o do Adamastor ou das sereias quer, na atualidade, com os pugilistas a combaterem num salão com o nome de Caravela. Mas para a artista o problema não é enfrentar o adversário mas lutar contra o seu próprio medo. Estas são pinturas com cores escuras que conferem um maior dramatismo e adensam o seu sofrimento interior. Nas imagens do combate de boxe, de Fátima contra Fátima, as mãos em vez de terem luvas estão envoltas em ligaduras que ocultam as feridas.
Urbano expõe na Galeria 111 desde 1997. Nascido na ilha de S. Miguel cresceu a olhar em seu redor para paisagens belíssimas com lagoas em crateras de vulcões, a ver sair fumarolas da terra e do mar, a sentir o chão a tremer debaixo dos seus pés e a ter a percepção da ameaça iminente duma catástrofe.
Na obra que cria reflete a sua visão do mundo, as origens e o sentido da vida.
Começou a desenhar e a pintar muito jovem e expôs individualmente pela primeira vez em 1983 no Museu Carlos Machado de Ponta Delgada. Nos anos noventa e depois de viver dois anos em Londres, onde estudou gravura na Slade School of Fine Art, dedicou-se exclusivamente à pintura. Apenas Antero, Da Humanidade e Memória dos Banhos das Alcaçarias são as primeiras séries a serem expostas.
Com a sua sensibilidade vai abordando os temas primordiais da natureza humana nas séries Do Mundo e do Ser, No Princípio, Os Primeiros Frutos.
De 2002 é a série Pálio, uma corrida de cavalos que se realiza duas vezes por ano, desde o século XIII, em Siena. Dez cavalos, montados no pelo por dez cavaleiros, dão três voltas à Piazza del Campo. Ao vencedor, que pode ser um cavalo sem cavaleiro, é entregue um pálio, um estandarte em seda pintado à mão.
Em 2004 o artista pinta Veneza em O Tempo Suspenso – palácios, igrejas, pontes, gondoleiros que transportam columbinas e arlequins através dos canais num ambiente feérico de Carnaval até ao fim da festa com os restos de flores de um funeral deslizando nas águas.
Apesar da permanente celebração da vida e da natureza está sempre atento ao que se passa no mundo registando as hecatombes como as que levaram ao sacrifício de milhares de animais devido a uma epidemia de febre aftosa em Europa 2001 e ainda um número maior num surto de gripe em As Últimas Aves, em 2006.
Em 2008 na série As Flores e as Cinzas abordou o tema dos incêndios que devastaram as florestas um pouco por todo o mundo. Mas a mãe natureza renasce sempre das suas próprias cinzas.
Em 2012 pinta a série Hespérides sobre a dramática crise económica que assolou a Grécia, berço da civilização ocidental. Aborda poeticamente o tema da União Europeia cujo objetivo é um pacto de paz e desenvolvimento económico entre os países que a compõem. Mas o jardim idílico das Hespérides, onde as árvores dão frutos de ouro está longe de ser um lugar de paz e de concórdia.
Em Biombos e Outras Janelas, de 2015, faz uma emocionada e discreta homenagem à sua mãe. São janelas abertas com cortinas esvoaçantes, onde pairam um anjo, uma jarra com flores ou uma taça com frutos.

Arlete Alves da Silva