Um ano passado sobre a sua extensa exposição na Culturgest, em Lisboa, Belén Uriel (Madrid, 1974) mostra na Galeria Fonseca Macedo três núcleos de peças muito distintos, seja em termos materiais, técnicos ou formais. Para além da diversidade dos meios a que a artista recorre e da variedade de soluções que explora, abrindo e desbravando constantemente novos caminhos na sua prática, as suas obras radicam numa apropriação do objecto comum, submetendo-o a operações de transformação (tão radicais quanto subtis) que ora mantêm o referente reconhecível, ora o despistam parcial ou completamente. O primeiro núcleo é composto por cinco fotografias, extraídas de uma série de dezasseis, que a artista realizou em 2011 e a que deu o título Good Companion Rooms (old and new side by side). Não são, como um olhar apressado e distraído poderá levar a crer, fotomontagens digitais ou a unificação pela fotografia de colagens. Essas fotografias registam frágeis maquetas em que Belén Uriel reinventa, a partir da recomposição dos seus elementos, imagens fotográficas dos espaços encenados de lojas modernistas de interiores das décadas de 1920 e 1930. Um segundo núcleo agrupa quatro esculturas, selecionadas de uma série mais extensa que a artista realizou ao longo de vários meses de trabalho intensivo, em 2015 e 2016, associando dois tipos de objectos: o decalque em papel machê de cestos de plástico; e, pousadas sobre esses volumes, figuras modeladas com toalhas de mesa a que o gesso confere rigidez, que recriam, numa escala maior, esses arranjos decorativos feitos com guardanapos que são tipicamente usados em situações cerimoniosas à volta da mesa. As esculturas podem ser entendidas como uma dupla celebração: celebração, por um lado, desses ornamentos efémeros, circunstanciais, e dos protocolos sociais em que eles participam; e celebração, por outro lado, da própria escultura, através da convocação não-hierárquica da relação entre a figura e o plinto, assim como de uma plausível alusão, porventura derrisória, à tradição do monumento. Tudo isso, talvez convenha acrescentar, a partir de um olhar em segundo grau, carregado de um humor subtil e de uma imaginação fantasiosa. Finalmente, a exposição traz a público pela primeira vez três pequenas peças de vidro, material que a artista tem vindo a experimentar e a utilizar abundantemente no seu trabalho desde o final de 2015, que transfiguram, pelo material e pela cor, pedaços de espuma habitualmente usados para proteger objectos frágeis e preciosos, nomeadamente obras de arte. Estes três núcleos e as obras que os compõem permitem o encontro ou o reencontro com o trabalho de uma artista com uma rara sensibilidade para a escultura, que atravessa uma fase de grande efervescência criativa