Luz – própria, Tudo o que existe

Beatriz Brum

01 Fevereiro | 16 Março, 2024

Obras

Press release

Luz – própria,

Tudo o que existe

BEATRIZ BRUM

 

Na Lua, a paisagem oferece uma imagem cardíaca da água a circular sob o solo lembrando corpos de pele muito fina e um meticuloso mapa azulado de vasos sanguíneos a enraizar pelo corpo-terra. As águas são opacas e os montes cristalinos. A luz do Sol atravessa abundantemente as montanhas transparentes de manhã e encontra as sombras nos rios e mares turvos durante a tarde.

 

A terminologia aplicada ao Espaço não escapa à organização binária do mundo distinguindo corpos luminosos de corpos iluminados. O Sol é um corpo luminoso que ilumina com a sua luz própria tudo o que o rodeia; ilumina também a Lua, um corpo iluminado.

 

Mas a distância entre dois corpos já são três,

Os corpos e a brisa que corre.

 

Há poucas imagens consensuais. Uma delas é a ideia de que não há pessoas iguais e que a cada ser humano se reserva uma combinação única de factores. Outra é que toda a gente vê o mesmo, o que resumiria a experiência humana a um conjunto de pessoas diferentes que vêem as mesmas coisas. A hegemonia da visão no desenvolvimento de verdade é a razão pela qual o registo de imagens é simultaneamente a base dos sistemas de vigilância e da construção de desejo. Em ambos os casos há imprecisões no processamento de imagem como as sombras nas câmaras de segurança ou as divisões escuras, dando a entender que há uma parte da vida que não se controla, que escapa, e se traduz numa energia de fé ou esperança pela possibilidade de falha e descanso da norma.

 

No Sol não há sombras. Nesta manhã de inverno soalheira a luz entra no ar e expande. É impossível abrir as pálpebras como se a luminosidade transbordasse a partícula onde entrou e enchesse o olho de uma lágrima gorda que abarrota a pálpebra inferior quase a ponto de verter. Quanto tempo aguentas? 3, 2, 1… caiu. Uff que alívio.

 

 Luz-Própria

Tudo o que existe é a segunda exposição individual de Beatriz Brum na Galeria Fonseca Macedo e marca um retorno ao papel como suporte protagonista naquilo que poderia ser um exercício de cartografia da vida luminosa.

O conjunto de desenhos que a artista apresenta continuam o seu pensamento sobre a luz e os seus limites plásticos através de uma proposta que extrema as possibilidades da iluminação a uma luminosidade quase total, própria. Brum pontua o espaço com uma sensibilidade tão cirúrgica quanto intuitiva na idealização de uma paisagem anímica singular, fonte de energia disponível para nutrição colectiva.

Os desenhos pretos, em contraste com o branco e o glitter presente em toda a sala, provocam um desejo intenso pela claridade e a abertura máxima. Como a sombra, estas obras sustentam a energia de fé que desbloqueia o usufruto do horizonte aberto, ilimitado e intemporal elevado pelo desenho mural e os desenhos brancos emoldurados. A escolha do papel como suporte companheiro define uma estrutura de segurança necessária ao arrojo da direcção, evidenciando e sustentando o espírito audaz da exposição.

 

Filipa da Rocha Nunes

Janeiro de 2024

 

Por vontade expressa da autora este texto não segue as regras do Acordo Ortográfico de 1990, atualmente em vigor.